sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Quando não vi o Papai-Noel

Não lembro exatamente que idade eu tinha. Lembro que morávamos num apartamento em São Paulo e que era época de natal. Minha mãe havia montado a árvore ao pé da janela, pra facilitar pro bom-velhinho, escrevêramos as cartas pedindo sei lá que brinquedos e agora nos divertíamos ali, à mesa de jantar.
Aquele dia foi bastante alegre pra mim; e se eu não tivesse caído no sono teria visto o Papai-Noel saltar de minha janela.
Mas não foi por isso que não o vi; nem meu natal foi vazio de imaginação.
Eu ainda tinha sono quando minha mãe me acordou e aos meus irmãos dizendo que ouvira o Papai-Noel. Fizemos silêncio e ouvimos o som de suas botas pisando o chão da sala. Nítido. Inconfundível. Saltamos da cama. O apartamento estava escuro; só a luz do corredor e a árvore de natal iluminavam o recinto.
Quando chegamos lá, meu pai estava à janela, apontando para o céu, dizendo que o Papai-Noel acabara de entrar no trenó e sair voando na direção que seu dedo apontava. Lembro que fiquei com aquela sensação de angústia, de quem nadou e morreu na praia. Queria muito ver o velhinho. Mas meu pai nos colocou na janela, que talvez víssemos o trenó passar, distante, de volta pro Pólo Norte.
Não vimos. E eu relutava em sair da janela. Temia que na hora em que saísse ele, o Papai-Noel, passaria por ela e eu perderia a chance de vê-lo. Restavam, porém, os presentes; e estes, por fim, me convenceram.
Lembro ainda da sensação daquele dia, de como a pouca luz contribuiu para estimular minha imaginação e me fazer sentir a magia do momento; de como as ideias simples de meus pais construíram o chamado “espírito de natal”.
Hoje, que já não sinto mais o encanto dessa data, tenho tal lembrança bem guardada em mim.
Ela foi intensa, alicerçou meu espírito; e eu gozo em rememorá-la, como a um passado de mistérios que nunca deve ser esquecido.

domingo, 19 de dezembro de 2010

“Je touche!”

A expressão que dá título a esta crônica é, acredito, dum poema do poeta e esgrimista Cyrano de Bergerac. Digo acredito porque conheço-a apenas pelo filme de nome homônimo. Mas deve ser parte dum poema seu, sim.
Falando do filme, ele foi baseado na peça teatral de 1897 de Edmond Rostand, poeta e dramaturgo francês, e tem no papel do poeta-esgrimista ninguém mais ninguém menos que Gérard Depardieu, que chegou a ganhar o prêmio de melhor ator do Festival de Cannes. Esse filme, de 1990, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, conta a vida de Cyrano (de uma personalidade forte, sincera, arrojada e, o principal, de um nariz excessivamente enorme), de sua militância e poesia e de sua paixão platônica por sua prima. Um filme fantástico! Uma personagem maravilhosa.
Uma curiosidade. Três anos antes, Steve Martin estrelou num filme chamado “Roxanne”, no qual ele interpretava um cara durão, narigudo e que tinha uma paixão platônica por uma mulher (Roxanne). Semelhante, não? Por algum tempo, cri que este fosse uma paráfrase, por assim dizer, daquele. Mas.
A cena que mais gosto, que mais me marcou daquele filme foi a de quando Cyrano vai a um espetáculo teatral, se não me engano, interrompe-o bruscamente, impõe sua personalidade, por assim dizer, faz algumas piadas e é insultado por um homem que faz referência ao seu enorme nariz. Todos ali sabem que não se deve apontar, falar ou mencionar tal defeito (ou qualidade, para algumas). Sendo assim, Cyrano o desafia e eles vão duelar do lado de fora do teatro.
É claro que a massa ali presente vai assistir ao duelo, já sabendo, na verdade, o que ocorreria. Enquanto duelam, a pedido de um que se encontra ali, eu acho, Cyrano, em voz alta, vai compondo um poema; e toda vez que ele fica face a face com o adversário, ele dá uma narigada no nariz do outro e profere: “Je touche!”. É ótimo! Adorei o filme, como já disse. E um dia o terei na minha estante.
Por ora, contento-me com um outro que adquiri recentemente quando ia assistir a “Avatar” (que a propósito é um bom filme), intitulado “Camille Claudel”, tendo Gérard Depardieu no papel de Rodin.
O filme mostra a paixão de Camille pela arte e pelo famoso escultor, levando-a a loucura. O longa é ótimo. Depardieu está muito bem no filme e igualmente Isabelle Adjani. Vale a pena vê-lo.
Outro filme que gosto muito e possuo em minha coleção é “o Conde de Monte Cristo”, também estrelado por Gérard Depardieu. Gosto do cara. A história já começa com Edmond Dantes na prisão e vai mostrando o que acontecera a ele, diferente do filme mais recente, estrelado por Jim Caviezel e com participação do ótimo Richard Harris (ator irlandês que faz o papel do velho culto na prisão, tendo estrelado “Camelot”, na pele do Rei Arthur, e pouco antes de morrer interpretou Dumbledore em “Harry Potter e a Pedra Filosofal”), que começa como manda o livro de Dumas.
Há ainda outros filmes adaptados de livros que desejo ver e possuir, como “Os três mosqueteiros”, com Depardieu, e as séries “Napoleão” e “Os miseráveis”, que têm Malkovich no elenco.
É, parece que peguei para falar do narigudo francês hoje. Dos dois, aliás.

domingo, 31 de outubro de 2010

Coisas bonitas


Minha avó me pediu que eu escrevesse sobre “coisas bonitas”, como “a Ana Maria Braga em seu programa”. (Espero que ela não esteja falando de quando esta se vestiu de Madonna). Ora, acaso não escrevo “coisas bonitas”?
Reli, então, minhas crônicas mais antigas e vi que, realmente, não falei das coisas bonitas: era só Lula, Sarney, o Jabba, o império todo. O George Lucas vai querer me cobrar direitos autorais... Pensei então em falar sobre mulheres, roubar uns versos do Vinícius, mas a Fabi, minha esposa, disse que plágio é crime... Então, não vi outra saída senão falar de poesia. A massa inculta que me aguente.
Yves Bonnefoy. Conheci-o por meio de Tolentino. Inicialmente em sua “Imitação...”. Depois, em suas entrevistas. Achei-o muito bom, de um verso intenso, forte; mais até do que o próprio Tolentino, por quem tenho profunda admiração. Mas isso não quer dizer que um seja melhor que o outro.
Bonnefoy nasceu na França em 1923, estudou matemática e filosofia. Leu Valéry, Rimbaud, Mallarmé, especialmente Baudelaire, sobre o qual fundamentou seu curso de mestrado. Conheceu o surrealismo na arte e na poesia, frequentando o grupo de Breton e fundando com alguns amigos a revista “La Révolucion La Nuit”. A partir daí, firmou sua originalidade poética, concedendo novos rumos à poesia francesa.
Sua poesia é marcada por uma busca incessante do “lugar verdadeiro” (e aqui podemos ver a influência que exerceu em Tolentino), do reencontro da unidade, não sem aceitar a limitação, a finitude e a morte como o barqueiro que conduz à simplicidade manifestada no ser. Enfim, um grande poeta.
Uns dos poemas seus, embora o conheça há pouco tempo, que mais gosto é o intitulado “A espuma, o arrecife”. E também “O poço”, “A neve”, que acho muito singela, e “A murta”, que transcrevo abaixo:

Por vezes te sabia a terra, eu bebia
Em teus lábios a angústia das nascentes
Quando brota das pedras quentes, e o verão
Dominava alto a pedra airosa e quem bebia.

Por vezes te dizia de murta e queimávamos
Árvore de teus gestos todos todo um dia.
Eram fogaréus breves de uma luz vestal.
Assim eu te inventava em teus cabelos claros.

Todo um nulo verão secara-nos os sonhos,
Tolhera a voz, inchara os corpos, quebrara os
                                [ferros.
Por vezes ia rodando o leito, barca livre
Que ganha lentamente o mais alto cio mar.

Mas o leitor aí do fundo não está muito contente com isto. Ouço-o balbuciar algo como Leminsky, Arnaldo, Russo, Cazuza, Caetano... É um senhor. Parece irritado. Dou de ombros. E penso que se ele não gosta de mim, sua filha deve gostar.
De qualquer modo, tomo lições com aqueles, pra mode ser mais isperto. E enquanto eles me transmitem sua experiença, à minha TV passa um documentário sobre a vida de Hitler.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Do outro lado da língua



O teclado era meu amigo fiel de todos os dias, com o humor de acordo com minha vontade a qualquer hora. Meu teclado me acompanhava até mesmo nas madrugadas em claro, quando eu resolvia deixar para dormir durante o clarear da vida. Ele tornou-se meu melhor amigo, talvez um filho, uma máquina que eu abraçava com amor e guardava bem próxima ao meu travesseiro. Tudo era circular até eu resolver transformar minha morada e mudar de país. Deixei esse amor da vida e parti sozinha por um período de adaptação longe do plano virtual.

Minha vida passou a ter mais caminhada e menos cadeiras para sentar, na Irlanda. Em algumas horas de sobra, eu ganhava minutos para a nostalgia da web. Foi quando percebi que a qualidade do tempo com a palavras tornou-se risível. Perdi também pontos, acentos, cedilha. Para poder manter meus textos em um blog sobre a língua portuguesa, resolvi esquecer dos erros e dar vantagem à publicação do conteúdo.

Talvez, a mesma forma encontrada para a sobrevivência entre a língua estrangeira (que é meu caso nesse país de língua inglesa, com todos os erros, sem preposições, com ordens invertidas ou sotaques de todo o mundo), assim também meu texto em português consiga ser entendido pelo contexto. Lembro-me da preocupação com a perfeição das palavras!

Agora, finamente estou tentando acertar as duas línguas em um novo teclado, adquirido após a experiência da saudade de casa, das palavras, das redes infinitas da Internet. Meu pequeno novo companheiro, daqui deste lado do Oceano, talvez trará textos incertos como este, pensamentos duvidosos, creio que me salvará de certo emburrecimento com a distância total do idioma do Brasil. Agora, sinto-me mais completa e acolhida por estar mais perto dos brasileiros, e quem sabe, talvez seja a hora de abrir uma porta para a comunicação com todo o mundo.

Estou de volta com mais intensidade neste blog a partir deste dia que ganhei meu novo amigo de 10.1”.

domingo, 24 de outubro de 2010

“Minha pátria é minha língua”

Creio nunca ter declarado minha paixão pela língua portuguesa. Faço-o agora nestes tempos de reforma.
Desde minha época de colegial fui inclinado às letras. Sentia, sem consciência disso, um prazer em escrever, em criar. Da mesma maneira que tenho prazer em sentir em minhas mãos um livro (tema para uma próxima crônica), tenho em manusear as palavras, buscá-las, tratá-las e fazer com que exalem sensações que arrebatem o leitor, se tanto posso.
Esse prazer não se resume ao ato da criação, mas também ao da leitura, inda que não inserido numa dissertação ou história. Como assim? Gosto da palavra pura, apartada de um contexto. Gosto de vê-la em sua simples construção e formação, especialmente as mais antigas.
Por exemplo: gosto da palavra escrita na era medieval “anarante”, que significa “ignorante”. Acho-a mais prática, por assim dizer. “Chanto” por “pranto”. Nessa mesma linha de praticidade, as palavras cujo “g” mudo foi suprimido (coisa muito e voga na era renascentista, veja Os Lusíadas), como, por exemplo, “dino” em lugar de “digno”; ou aquelas cujo prefixo “sub” era substituído, a desejo do autor, pelo “so” em palavras como “subjugado”, ficando “sojugado” (tendo também a variação “sojuzgado”), “submeter”, tornando-se “someter”, e assim por diante.
Agradam-me as conjugações arcaicas, especialmente a do verbo “ser” no presente do indicativo: eu “soo”, ou “sejo”, ou “son” (como “m” ou “n”); tu “sês”; ele “sê” (daí o imperativo “sê” da segunda pessoa do singular). Ou a do verbo “estar” do presente do subjuntivo: tu “estês”, ele “estê”. Ou a do verbo “impedir” do indicativo: eu “impido”; e as do subjuntivo: eu “impida”, tu “impidas”, e por aí vai.
Aprazam-me ainda os termos (e digo isto sabendo que meu conhecimento acerca da língua portuguesa arcaica é totalmente baseada em pesquisas que fiz ao longo das minhas leituras de manuscritos encontrados na internet e de livros cuja grafia teve-se o decoro de manter-se, para o meu deleite), me aprazam ainda os termos com acréscimos de vogais, como por exemplo “alevantar” ou “escuitar”; e ainda os de inversão, como “tromento” e “prefeito”(que significava “perfeito”, já que este era “perfecto”, da mesma forma que “aspecto” era “aspeito”).
Gosto das abreviações que se fazia, segundo minhas pesquisas, na época renascentista. Por exemplo: “que”, redigido “q”; “quẽ”, na maioria das vezes escrito “q” com um til em cima; “ũa”, a mais famosa; e outras palavras cujos emes ou enes eram substituídos pelo til, qual “ẽblema”. Tudo para facilitar o processo de impressão de livros, o qual na época era feito à mão. E gosto ainda das escritas sem o “h” inicial, como “omen”, ou “ome”, ou “omẽ”, “ora” (significando “hora”). Ou as com o “h”: “húmido” (que até antes da reforma era presente na ortografia de Portugal). E ainda as com o “c”, “b” ou “p” mudos, sendo muitas ainda existentes hoje: “sancto”, “subtil” (que era às vezes “sotil” e não sei se até recentemente vigente em Portugal), “concepto”, que se encaixa na regra do parágrafo anterior. Tais abreviações eram aceitas por todos à época, uma vez que não havia um registro formal da fala, isto é, uma gramática.
Também acho interessantes as proparoxítonas, as paroxítonas terminadas em ditongo crescente (e às vezes as dos hiatos “i” e “u” [digo às vezes por acreditar que tal acentuação fosse optativa]) e as oxítonas terminadas em “-em” não acentuadas (tudo ainda vigente no século passado).
O que me encanta, no fundo, de modo geral, é a liberdade, que promoveu a mudança da língua até os dias de hoje, que se pode ter ao falá-la e mesmo ao escrevê-la, a beleza que ela, e a praticidade, e a necessidade propiciam aos nossos ouvidos e olhos.
Desse modo, não deixo de achar no mínimo estimulante essa reforma ortográfica recente.
Gostei parcialmente da alteração na regra do hífen e achei interessante a exclusão dos acentos nos ditongos “ee” e “oo”. O que me leva a pensar que talvez devesse-se minorar os acentos, facilitando a regra, deixando-se de acentuar as proparoxítonas e as paroxítonas. Seria confuso? Nos acostumaríamos. E ainda alterar-se as concordâncias verbais e nominais, facilitando-as. E talvez a regra dos porquês, adequando-a à da acentuação.
Ouvi falar que queria-se unir os termos “por isso” e “de repente”, ficando “porisso” e “derrepente”. Não sei se seria interessante, ou mesmo bonito, mas vale a liberdade de que falei. E fico pensando que nessa mesma linha de raciocínio serviria “assinquê”, “paraquê”, enfim. Mas, idem.
A língua portuguesa irá mudar muito ainda; e acredito que um dia ela morrerá, como já dissera Pessoa: será estudada como base da língua derivada dela, inda que tendo absorvido outras línguas, considerada por muitos como mais bonita ou requintada, falada por uma pequena minoria culta e por fim (ou “porfim”) será morta.
Mas não importa: enquanto ela durar, com suas mudanças, sua evolução, será bela e eterna. Desculpe Vinícius. Ou eu o desculpo.

domingo, 17 de outubro de 2010

Um incentivo à vida

Escrevi um livro de mentiras. Publiquei-o.
Na noite de autógrafos, uma senhora se aproximou de mim, com meu livro em mãos, e perguntou-me: “Que razão você me dá pra eu comprar este livro?”.
Eu não sabia o que arrazoar. Ela continuou: “Porque já que este livro é uma mentira, qual a razão para eu comprá-lo?”.
Então lhe disse: “Não há razão por que comprá-lo”. Ela pareceu aliviada, mas duvidosa. “Porque não há razão na vida”.
Ela, naturalmente, atarantou-se. Não com a madureza infesta com que lhe redargui, mas com a imponência poética da mesma.
Deu-me o livro que o autografasse e, colocando-o debaixo do braço, conferiu lugar ao próximo leitor.

sábado, 16 de outubro de 2010

A delícia do desigual...

Eu sempre me espanto com a beleza da feiúra. Ainda agora, visitando um poeta e, por acaso, topando com seu rosto, o olho um tanto caído, um nariz desfigurado, a boca pequena demais, me vi pensando: puta cara lindo! E era feio, evidentemente feio, despudoradamente feio. Feio sem pedir permissão.

Já me disseram que isso é alguma tentativa de salvar a minha alma (também feia) ou resignar os meus complexos (também feios) de não ser exatamente bonita (mas nem feia!). Talvez. Não ter traços e formas perfeitas nunca me causou grande desconforto. Melhor: causou desconforto naquela época da adolescência em que a amiga loira é sempre a cortejada pelos fortões do fundo da sala. Passada a fase da castração do louvor próprio, nós, mulheres imperfeitas, descobrimos que um movimento com a mão, uma frase bem empregada, um olhar derretido, uma ou duas tiradas sacanas vencem qualquer atributo divino impregnado no DNA da tal amiga. No final das contas, entendemos que elas eram bem das chatinhas e eles, os garanhões, uns babacas de marca maior. Por isso, ou pela dialética do meu papo doce e pérfido, eu nunca estive sozinha.

Abusando da Martinidade (salve a Vila, salve ele, salve Martinho!), eu já tive homens de todas as cores, várias idades e muitos amores. E feios (se vc foi meu amor, entrou no blog e ficou ofendido, desculpe. Provavelmente não estou falando de vc). Os bonitos - e houve alguns lindos - não conseguiram me matar de paixão. Pelos perfeitos, de testa retinha, boca desenhada e corpos com divisões claras entre os músculos, não chorei uma semana. Pelos que não se enquadravam, os vesgos, caolhos, de andar cambaleante, óculos grossos e algum desaviso, eu quis morrer, cortar os pulsos.

Pode ser coincidência, claro que pode, mas acho mesmo que é uma opção do olhar. Meu desejo vem no frêmito da imperfeição. E só Deus (e os meus suores) sabem da malemolência das paixões de rodapé. O cantinho mais escuro - e onírico - do desajuste me interessa mais do que a mesa bem posta e a luz direta. A via de contramão é sempre (um) melhor caminho. E os homens que não sorriem com dentes perfeitos, aiai, mordem como ninguém.


* moço do meus encantos: vc é o único que conjuga a perfeição de um deus com a virulência do meu espanto em carne, osso e líquidos, viu? :-)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

“Impressoes do tempo que muda em segundos”

Resposta `a viagem insolita de Ivan

Em certo momento, encontrei-me adulta numa vida solitaria, vontades pareciam dificuldades para serem minha luta, sem interesse alheio. Pensei estar sozinha, mesmo entre amigos, no trabalho de realizar. As situacoes duras e frias me mostravam apenas uma escuridao para encontrar meu caminho.... pensei que os trabalhos em equipe fossem apenas brincadeiras de crianca de um passado ilusorio. Foi enquanto eu comecava uma jornada cega. Mesmo assim, continuei ate o fim ja sabendo que o prazer viria no primeiro sinal de vitoria...

A vitoria foi encontrar pessoas dispostas a estarem juntas, nao apenas para a realizacao de sonhos, mas para uma vida em conjunto, para dividir os ingredientes, o momento de cozinhar e o sabor da comida. Saudei quando descobri que o problema anterior era meu relogio interno que estava des-regulado numa cidade que nao via o tempo passar, e que eu havia me deixado levar pela ilusao da sensacao do tempo.

Aproveitando melhor a vida onde dizem que nao se leva nada embora, sobra tempo para viver pequenas companhias, como a cor do reflexo da rua, o som da agua do quintal, o canto de raros passarinhos ou o sabor delicioso daquilo que nao se gosta na hora da fome. Se parar o tempo, tudo parece melhor para saborear. Aqui morre um ponto de vista para dar lugar `a mais uma experiencia de vida.

Blog-se

Nao sei bem se ‘e efeito das cidades ou do tempo, mas alguns buscam a perfeicao do outro. Alguns acreditam que ‘e preciso criticar e falar sobre o que acontece no mundo (inclusive essa ‘e a minha profissao: o jornalismo). Comentar a transicao talvez seja a necessidade de documentar a evolucao e no futuro dizer que assim fomos n’os. Blogs estao ai para serem testados da melhor ou pior maneira e com certeza ‘e uma boa quando se encontra algo de qualidade, “ja valeu a pena passar por tantos ruins”. ‘E como acontece tambem com as situacoes da vida!

Acredito que fazer arte pacifica o homem, logo, imagino que o poder desabafar deixa o mundo mais informado e tambem mais tranquilo. A informacao dos blogs chegara ao cansaco.... como o dia do juizo final, os blogs ganharao uma definicao, um resultado e finalmente o porque de ser.

domingo, 10 de outubro de 2010

Livros, se lê-los por que não tê-los?

Talvez o leitor esteja cansado de me ouvir falar de livros. Mas peço a sua paciência. Este escritor está cansado de falar do Lula. E os livros têm sido (e são) uma de suas boas companhias.
Diferentemente de outras pessoas, não sou chegado a baladas, danceterias, bares noturnos que tocam pagode e coisas afins. Sou pacato, caseiro. Gosto de passar um fim-de-semana junto à família e aos amigos. Gosto da reunião.
Entretanto, há “baladas” que gosto, como por exemplo ir a uma livraria, mesmo que não vá comprar nada. Gosto de ver os livros, conhecer as novidades, as edições de obras antigas. Uma mais bela do que a outra. Como por exemplo a edição da Dom Quixote do famoso livro de Cervantes ilustrado pelo Dalí. Uma beleza!
Gosto de lê-los, se possível. Não os leio por inteiro, como se pode fazer nalgumas livrarias. Sentar-se numa poltrona e ler durante horas a fio. Beber café, comer pão-de-queijo... Dá uma sensação de liberdade, de que o mundo é um lugar tranquilo e gostoso de se viver. Mas os leio, os degusto como posso e como quero.
Em São Paulo há algumas livrarias que permitem leitura sem compra, por assim dizer. Conheço a Livraria Cultura e a Fnac, que possuem um acervo excelente além de tudo.
Porém, não entendo por que algumas livrarias não aceitam que seus clientes tomem dos livros e os leiam em seu interior. Acredito que seja por que dessa forma os clientes lerão o que desejarem sem precisar desembolsar um centavo e, assim, a lógica capitalista não se fará. É o mais óbvio e talvez único motivo.
Mas acho que elas se equivocam. Pois, para quem gosta de ler, possuir o livro é mais do que uma vontade: é uma necessidade, quase um vício, uma certeza de que o conhecimento e assim momentos de prazer e paz estarão sempre ao seu alcance.
Outro prazer que tenho, e acredito que qualquer fã de livros também o tenha, é folheá-los, senti-los em minha mão. Mas não sou tarado, fique tranquilo. E isso não só com as edições luxuosas, alvos da cobiça, mas, e principalmente, eu diria, com as edições velhas, antigas, desgastadas, carcomidas, até, pelo tempo. Gosto especialmente dessas, que só encontramos em sebos, claro.
Tenho um prazer imenso em folhear um livro antigo, de páginas de cortes irregulares, amareladas pelo pai de Zeus, cheirando a sarrafo, com ácaros e tudo. O problema é a minha rinite. Mas.
Aqui em casa tenho alguns exemplares assim.
Por exemplo, a primeira edição das “Obras completas” de Camões com prefácio e notas de Hernâni Cidade divididas em cinco volumes, editadas pela Livraria Sá da Costa Editora. No primeiro, encontram-se as redondilhas e os sonetos do poeta; no segundo, as odes, as elegias e outros gêneros líricos considerados maiores; no terceiro, os autos e as cartas; no quarto e no quinto, Os Lusíadas. Uma edição ótima, pois além de ser antiga (fico devendo a data da publicação, por não tê-la encontrado) mantém ainda, mesmo que parcamente, a grafia da época.
Outro exemplar antigo, amarelecido, consumido pelo tempo, é a quinta edição de “Rubáiyát”, de Omar Kháyyám, poeta, matemático e astrônomo persa, editada pela Livraria José Olympio Editora, datada de 1944. Além dessa, possuo a primeira edição do “Teatro de Gil Vicente”, uma antologia da Portugália Editora, datada de 1959 e apresentada por António José Saraiva. Nesta a grafia da época é ainda mais abundante. Para mim, um mar onde posso mergulhar de cabeça.
Tenho também a segunda edição de “Aparição”, de Vergílio Ferreira, também pela Portugália, datada de 1960. E de 1951, a primeira edição do Clube do Livro da “Vênus de Bronze” do Merimée. Ambas atacam minha rinite. Fazer o quê. E uma não tão acabada assim, apesar de ser a mais antiga, data de 1941, é a terceira edição de “Amadis de Gaula”, traduzida por Rodrigues Lapa e editada pela Lisboa.
Gosto dessas edições, muito embora nem sempre aprecie o conteúdo delas, que é o caso aqui do poeta persa.
Mas não importa, tenho um enorme prazer em folhear um livro antigo, senti-lo em minhas mãos (repito: não sou tarado) e lê-lo com o maior prazer do mundo.

sábado, 9 de outubro de 2010

Oi, pessoal. Voltei. Com a barriga cortada por uma cirurgia de emergência, mas ainda assim inteira. Bom, quase inteira, que 100% nunca fui. Já nasci trincada...*risos*. Agora, ao texto! Beijos e boa semana.

Declarações


É uma segunda-feira de um sol indecente. O Rio de Janeiro continua vasto demais, cheio de esquinas e subterfúgios. Ainda vou odiar essa cidade, escreva aí no teu diário das minhas invenções, escreva, anote.

Meu corpo silva a tua falta. A lâmina da saudade corta nacos da minha carne: minha boca, meu dorso, meus pés, meus seios. Meus eixos. O apartamento vazio faz brotar um dragão vermelho e cheiros de urros e labaredas que vão tomando conta do meu desespero e que se controla com doses vulgares do que fomos, do que estamos, do que não fazemos a menor idéia (e nunca sei se essa é a melhor parte ou se é o que me deságua). Ele me co-habita, o dragão, e assiste comigo os filmes que não vimos juntos e os livros que não compartilhamos. E se ajeita no sofá, me morde as têmporas e queima meu tempo. É um bom dragão e adormece enquanto eu conto a nossa história cristalina, límpida e de final infeliz. Mas ele não chora porque diz que as lágrimas secariam como cera e formariam um dossel encantado, e nenhum encantamento merece a aflição dos meus dias sem você.

Sou sempre viúva, visto negro. Mas não tenho medo algum da solidão, veja você que avanço. Converso com cada um dos homens que tive, com cada um dos que terei, e lamento com eles que teu nome esteja tatuado em mim de maneira tão devassa, impudica. Todo rastro é lastro quando teu nome é o meio e nenhuma dor jamais será tão digna dessa cor vermelha, vermelha escaldante. "Minhas páginas estão marcadas, dear, se você quiser será assim", eu direi, e um ou outro tresloucado vai aceitar essa troca pouco justa e vai ter meus afetos com uma profundidade que não. E ele vai acreditar, e vai se entregar, e vai assentir, e vai renegar, e vai retrair, vai se machucar, e vai indagar. E vai me odiar. E eu vou te amar ainda mais em cada possibilidade com outro som, outro gemido, outro toque, outro corpo. Você é eterno e eu que defino o tamanho da minha vastidão. Eu. Mais ninguém. E nisso, cherry, nem você apita.

Não, não, eu não serei uma daquelas pessoas que tomam café com creme sozinhas no cinema enquanto esperam a sessão. Tampouco serei uma moça de cabelos molhados que mais olha para o chão do que para os outros entre estantes de uma livraria. Também não vou ter ares de pequena loucura, olhos fundos deitados sobre um livro, uma folha branca sendo preenchida enquanto um copo é esvaziado em algum restaurante quase chique da zona sul (tão digno de mim que indigna de tudo!). E nem me imagine como uma distinta senhora de cabelos brancos e óculos de aros vermelhos a dourar a pílula da vida alheia - sublimando os desejos que nascerão entre as minhas vírgulas - quando chegar a tarde dos meus anos todos. Não tenho fôlego para viver assim, aos poucos, pela tangente, você sabe. Vou seguir o roteiro que eu tão bem tracei, vou vestir a personagem e seguir bailando: mãos na cintura, olhares lascivos, risadas largas e tiradas de humor dúbio. Eu, elas e eles, todos. Porque eu sou mesmo muito boa em fazer amor, amigos e macarrão instantâneos.