sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Quando não vi o Papai-Noel

Não lembro exatamente que idade eu tinha. Lembro que morávamos num apartamento em São Paulo e que era época de natal. Minha mãe havia montado a árvore ao pé da janela, pra facilitar pro bom-velhinho, escrevêramos as cartas pedindo sei lá que brinquedos e agora nos divertíamos ali, à mesa de jantar.
Aquele dia foi bastante alegre pra mim; e se eu não tivesse caído no sono teria visto o Papai-Noel saltar de minha janela.
Mas não foi por isso que não o vi; nem meu natal foi vazio de imaginação.
Eu ainda tinha sono quando minha mãe me acordou e aos meus irmãos dizendo que ouvira o Papai-Noel. Fizemos silêncio e ouvimos o som de suas botas pisando o chão da sala. Nítido. Inconfundível. Saltamos da cama. O apartamento estava escuro; só a luz do corredor e a árvore de natal iluminavam o recinto.
Quando chegamos lá, meu pai estava à janela, apontando para o céu, dizendo que o Papai-Noel acabara de entrar no trenó e sair voando na direção que seu dedo apontava. Lembro que fiquei com aquela sensação de angústia, de quem nadou e morreu na praia. Queria muito ver o velhinho. Mas meu pai nos colocou na janela, que talvez víssemos o trenó passar, distante, de volta pro Pólo Norte.
Não vimos. E eu relutava em sair da janela. Temia que na hora em que saísse ele, o Papai-Noel, passaria por ela e eu perderia a chance de vê-lo. Restavam, porém, os presentes; e estes, por fim, me convenceram.
Lembro ainda da sensação daquele dia, de como a pouca luz contribuiu para estimular minha imaginação e me fazer sentir a magia do momento; de como as ideias simples de meus pais construíram o chamado “espírito de natal”.
Hoje, que já não sinto mais o encanto dessa data, tenho tal lembrança bem guardada em mim.
Ela foi intensa, alicerçou meu espírito; e eu gozo em rememorá-la, como a um passado de mistérios que nunca deve ser esquecido.

domingo, 19 de dezembro de 2010

“Je touche!”

A expressão que dá título a esta crônica é, acredito, dum poema do poeta e esgrimista Cyrano de Bergerac. Digo acredito porque conheço-a apenas pelo filme de nome homônimo. Mas deve ser parte dum poema seu, sim.
Falando do filme, ele foi baseado na peça teatral de 1897 de Edmond Rostand, poeta e dramaturgo francês, e tem no papel do poeta-esgrimista ninguém mais ninguém menos que Gérard Depardieu, que chegou a ganhar o prêmio de melhor ator do Festival de Cannes. Esse filme, de 1990, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, conta a vida de Cyrano (de uma personalidade forte, sincera, arrojada e, o principal, de um nariz excessivamente enorme), de sua militância e poesia e de sua paixão platônica por sua prima. Um filme fantástico! Uma personagem maravilhosa.
Uma curiosidade. Três anos antes, Steve Martin estrelou num filme chamado “Roxanne”, no qual ele interpretava um cara durão, narigudo e que tinha uma paixão platônica por uma mulher (Roxanne). Semelhante, não? Por algum tempo, cri que este fosse uma paráfrase, por assim dizer, daquele. Mas.
A cena que mais gosto, que mais me marcou daquele filme foi a de quando Cyrano vai a um espetáculo teatral, se não me engano, interrompe-o bruscamente, impõe sua personalidade, por assim dizer, faz algumas piadas e é insultado por um homem que faz referência ao seu enorme nariz. Todos ali sabem que não se deve apontar, falar ou mencionar tal defeito (ou qualidade, para algumas). Sendo assim, Cyrano o desafia e eles vão duelar do lado de fora do teatro.
É claro que a massa ali presente vai assistir ao duelo, já sabendo, na verdade, o que ocorreria. Enquanto duelam, a pedido de um que se encontra ali, eu acho, Cyrano, em voz alta, vai compondo um poema; e toda vez que ele fica face a face com o adversário, ele dá uma narigada no nariz do outro e profere: “Je touche!”. É ótimo! Adorei o filme, como já disse. E um dia o terei na minha estante.
Por ora, contento-me com um outro que adquiri recentemente quando ia assistir a “Avatar” (que a propósito é um bom filme), intitulado “Camille Claudel”, tendo Gérard Depardieu no papel de Rodin.
O filme mostra a paixão de Camille pela arte e pelo famoso escultor, levando-a a loucura. O longa é ótimo. Depardieu está muito bem no filme e igualmente Isabelle Adjani. Vale a pena vê-lo.
Outro filme que gosto muito e possuo em minha coleção é “o Conde de Monte Cristo”, também estrelado por Gérard Depardieu. Gosto do cara. A história já começa com Edmond Dantes na prisão e vai mostrando o que acontecera a ele, diferente do filme mais recente, estrelado por Jim Caviezel e com participação do ótimo Richard Harris (ator irlandês que faz o papel do velho culto na prisão, tendo estrelado “Camelot”, na pele do Rei Arthur, e pouco antes de morrer interpretou Dumbledore em “Harry Potter e a Pedra Filosofal”), que começa como manda o livro de Dumas.
Há ainda outros filmes adaptados de livros que desejo ver e possuir, como “Os três mosqueteiros”, com Depardieu, e as séries “Napoleão” e “Os miseráveis”, que têm Malkovich no elenco.
É, parece que peguei para falar do narigudo francês hoje. Dos dois, aliás.

domingo, 31 de outubro de 2010

Coisas bonitas


Minha avó me pediu que eu escrevesse sobre “coisas bonitas”, como “a Ana Maria Braga em seu programa”. (Espero que ela não esteja falando de quando esta se vestiu de Madonna). Ora, acaso não escrevo “coisas bonitas”?
Reli, então, minhas crônicas mais antigas e vi que, realmente, não falei das coisas bonitas: era só Lula, Sarney, o Jabba, o império todo. O George Lucas vai querer me cobrar direitos autorais... Pensei então em falar sobre mulheres, roubar uns versos do Vinícius, mas a Fabi, minha esposa, disse que plágio é crime... Então, não vi outra saída senão falar de poesia. A massa inculta que me aguente.
Yves Bonnefoy. Conheci-o por meio de Tolentino. Inicialmente em sua “Imitação...”. Depois, em suas entrevistas. Achei-o muito bom, de um verso intenso, forte; mais até do que o próprio Tolentino, por quem tenho profunda admiração. Mas isso não quer dizer que um seja melhor que o outro.
Bonnefoy nasceu na França em 1923, estudou matemática e filosofia. Leu Valéry, Rimbaud, Mallarmé, especialmente Baudelaire, sobre o qual fundamentou seu curso de mestrado. Conheceu o surrealismo na arte e na poesia, frequentando o grupo de Breton e fundando com alguns amigos a revista “La Révolucion La Nuit”. A partir daí, firmou sua originalidade poética, concedendo novos rumos à poesia francesa.
Sua poesia é marcada por uma busca incessante do “lugar verdadeiro” (e aqui podemos ver a influência que exerceu em Tolentino), do reencontro da unidade, não sem aceitar a limitação, a finitude e a morte como o barqueiro que conduz à simplicidade manifestada no ser. Enfim, um grande poeta.
Uns dos poemas seus, embora o conheça há pouco tempo, que mais gosto é o intitulado “A espuma, o arrecife”. E também “O poço”, “A neve”, que acho muito singela, e “A murta”, que transcrevo abaixo:

Por vezes te sabia a terra, eu bebia
Em teus lábios a angústia das nascentes
Quando brota das pedras quentes, e o verão
Dominava alto a pedra airosa e quem bebia.

Por vezes te dizia de murta e queimávamos
Árvore de teus gestos todos todo um dia.
Eram fogaréus breves de uma luz vestal.
Assim eu te inventava em teus cabelos claros.

Todo um nulo verão secara-nos os sonhos,
Tolhera a voz, inchara os corpos, quebrara os
                                [ferros.
Por vezes ia rodando o leito, barca livre
Que ganha lentamente o mais alto cio mar.

Mas o leitor aí do fundo não está muito contente com isto. Ouço-o balbuciar algo como Leminsky, Arnaldo, Russo, Cazuza, Caetano... É um senhor. Parece irritado. Dou de ombros. E penso que se ele não gosta de mim, sua filha deve gostar.
De qualquer modo, tomo lições com aqueles, pra mode ser mais isperto. E enquanto eles me transmitem sua experiença, à minha TV passa um documentário sobre a vida de Hitler.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Do outro lado da língua



O teclado era meu amigo fiel de todos os dias, com o humor de acordo com minha vontade a qualquer hora. Meu teclado me acompanhava até mesmo nas madrugadas em claro, quando eu resolvia deixar para dormir durante o clarear da vida. Ele tornou-se meu melhor amigo, talvez um filho, uma máquina que eu abraçava com amor e guardava bem próxima ao meu travesseiro. Tudo era circular até eu resolver transformar minha morada e mudar de país. Deixei esse amor da vida e parti sozinha por um período de adaptação longe do plano virtual.

Minha vida passou a ter mais caminhada e menos cadeiras para sentar, na Irlanda. Em algumas horas de sobra, eu ganhava minutos para a nostalgia da web. Foi quando percebi que a qualidade do tempo com a palavras tornou-se risível. Perdi também pontos, acentos, cedilha. Para poder manter meus textos em um blog sobre a língua portuguesa, resolvi esquecer dos erros e dar vantagem à publicação do conteúdo.

Talvez, a mesma forma encontrada para a sobrevivência entre a língua estrangeira (que é meu caso nesse país de língua inglesa, com todos os erros, sem preposições, com ordens invertidas ou sotaques de todo o mundo), assim também meu texto em português consiga ser entendido pelo contexto. Lembro-me da preocupação com a perfeição das palavras!

Agora, finamente estou tentando acertar as duas línguas em um novo teclado, adquirido após a experiência da saudade de casa, das palavras, das redes infinitas da Internet. Meu pequeno novo companheiro, daqui deste lado do Oceano, talvez trará textos incertos como este, pensamentos duvidosos, creio que me salvará de certo emburrecimento com a distância total do idioma do Brasil. Agora, sinto-me mais completa e acolhida por estar mais perto dos brasileiros, e quem sabe, talvez seja a hora de abrir uma porta para a comunicação com todo o mundo.

Estou de volta com mais intensidade neste blog a partir deste dia que ganhei meu novo amigo de 10.1”.

domingo, 24 de outubro de 2010

“Minha pátria é minha língua”

Creio nunca ter declarado minha paixão pela língua portuguesa. Faço-o agora nestes tempos de reforma.
Desde minha época de colegial fui inclinado às letras. Sentia, sem consciência disso, um prazer em escrever, em criar. Da mesma maneira que tenho prazer em sentir em minhas mãos um livro (tema para uma próxima crônica), tenho em manusear as palavras, buscá-las, tratá-las e fazer com que exalem sensações que arrebatem o leitor, se tanto posso.
Esse prazer não se resume ao ato da criação, mas também ao da leitura, inda que não inserido numa dissertação ou história. Como assim? Gosto da palavra pura, apartada de um contexto. Gosto de vê-la em sua simples construção e formação, especialmente as mais antigas.
Por exemplo: gosto da palavra escrita na era medieval “anarante”, que significa “ignorante”. Acho-a mais prática, por assim dizer. “Chanto” por “pranto”. Nessa mesma linha de praticidade, as palavras cujo “g” mudo foi suprimido (coisa muito e voga na era renascentista, veja Os Lusíadas), como, por exemplo, “dino” em lugar de “digno”; ou aquelas cujo prefixo “sub” era substituído, a desejo do autor, pelo “so” em palavras como “subjugado”, ficando “sojugado” (tendo também a variação “sojuzgado”), “submeter”, tornando-se “someter”, e assim por diante.
Agradam-me as conjugações arcaicas, especialmente a do verbo “ser” no presente do indicativo: eu “soo”, ou “sejo”, ou “son” (como “m” ou “n”); tu “sês”; ele “sê” (daí o imperativo “sê” da segunda pessoa do singular). Ou a do verbo “estar” do presente do subjuntivo: tu “estês”, ele “estê”. Ou a do verbo “impedir” do indicativo: eu “impido”; e as do subjuntivo: eu “impida”, tu “impidas”, e por aí vai.
Aprazam-me ainda os termos (e digo isto sabendo que meu conhecimento acerca da língua portuguesa arcaica é totalmente baseada em pesquisas que fiz ao longo das minhas leituras de manuscritos encontrados na internet e de livros cuja grafia teve-se o decoro de manter-se, para o meu deleite), me aprazam ainda os termos com acréscimos de vogais, como por exemplo “alevantar” ou “escuitar”; e ainda os de inversão, como “tromento” e “prefeito”(que significava “perfeito”, já que este era “perfecto”, da mesma forma que “aspecto” era “aspeito”).
Gosto das abreviações que se fazia, segundo minhas pesquisas, na época renascentista. Por exemplo: “que”, redigido “q”; “quẽ”, na maioria das vezes escrito “q” com um til em cima; “ũa”, a mais famosa; e outras palavras cujos emes ou enes eram substituídos pelo til, qual “ẽblema”. Tudo para facilitar o processo de impressão de livros, o qual na época era feito à mão. E gosto ainda das escritas sem o “h” inicial, como “omen”, ou “ome”, ou “omẽ”, “ora” (significando “hora”). Ou as com o “h”: “húmido” (que até antes da reforma era presente na ortografia de Portugal). E ainda as com o “c”, “b” ou “p” mudos, sendo muitas ainda existentes hoje: “sancto”, “subtil” (que era às vezes “sotil” e não sei se até recentemente vigente em Portugal), “concepto”, que se encaixa na regra do parágrafo anterior. Tais abreviações eram aceitas por todos à época, uma vez que não havia um registro formal da fala, isto é, uma gramática.
Também acho interessantes as proparoxítonas, as paroxítonas terminadas em ditongo crescente (e às vezes as dos hiatos “i” e “u” [digo às vezes por acreditar que tal acentuação fosse optativa]) e as oxítonas terminadas em “-em” não acentuadas (tudo ainda vigente no século passado).
O que me encanta, no fundo, de modo geral, é a liberdade, que promoveu a mudança da língua até os dias de hoje, que se pode ter ao falá-la e mesmo ao escrevê-la, a beleza que ela, e a praticidade, e a necessidade propiciam aos nossos ouvidos e olhos.
Desse modo, não deixo de achar no mínimo estimulante essa reforma ortográfica recente.
Gostei parcialmente da alteração na regra do hífen e achei interessante a exclusão dos acentos nos ditongos “ee” e “oo”. O que me leva a pensar que talvez devesse-se minorar os acentos, facilitando a regra, deixando-se de acentuar as proparoxítonas e as paroxítonas. Seria confuso? Nos acostumaríamos. E ainda alterar-se as concordâncias verbais e nominais, facilitando-as. E talvez a regra dos porquês, adequando-a à da acentuação.
Ouvi falar que queria-se unir os termos “por isso” e “de repente”, ficando “porisso” e “derrepente”. Não sei se seria interessante, ou mesmo bonito, mas vale a liberdade de que falei. E fico pensando que nessa mesma linha de raciocínio serviria “assinquê”, “paraquê”, enfim. Mas, idem.
A língua portuguesa irá mudar muito ainda; e acredito que um dia ela morrerá, como já dissera Pessoa: será estudada como base da língua derivada dela, inda que tendo absorvido outras línguas, considerada por muitos como mais bonita ou requintada, falada por uma pequena minoria culta e por fim (ou “porfim”) será morta.
Mas não importa: enquanto ela durar, com suas mudanças, sua evolução, será bela e eterna. Desculpe Vinícius. Ou eu o desculpo.

domingo, 17 de outubro de 2010

Um incentivo à vida

Escrevi um livro de mentiras. Publiquei-o.
Na noite de autógrafos, uma senhora se aproximou de mim, com meu livro em mãos, e perguntou-me: “Que razão você me dá pra eu comprar este livro?”.
Eu não sabia o que arrazoar. Ela continuou: “Porque já que este livro é uma mentira, qual a razão para eu comprá-lo?”.
Então lhe disse: “Não há razão por que comprá-lo”. Ela pareceu aliviada, mas duvidosa. “Porque não há razão na vida”.
Ela, naturalmente, atarantou-se. Não com a madureza infesta com que lhe redargui, mas com a imponência poética da mesma.
Deu-me o livro que o autografasse e, colocando-o debaixo do braço, conferiu lugar ao próximo leitor.

sábado, 16 de outubro de 2010

A delícia do desigual...

Eu sempre me espanto com a beleza da feiúra. Ainda agora, visitando um poeta e, por acaso, topando com seu rosto, o olho um tanto caído, um nariz desfigurado, a boca pequena demais, me vi pensando: puta cara lindo! E era feio, evidentemente feio, despudoradamente feio. Feio sem pedir permissão.

Já me disseram que isso é alguma tentativa de salvar a minha alma (também feia) ou resignar os meus complexos (também feios) de não ser exatamente bonita (mas nem feia!). Talvez. Não ter traços e formas perfeitas nunca me causou grande desconforto. Melhor: causou desconforto naquela época da adolescência em que a amiga loira é sempre a cortejada pelos fortões do fundo da sala. Passada a fase da castração do louvor próprio, nós, mulheres imperfeitas, descobrimos que um movimento com a mão, uma frase bem empregada, um olhar derretido, uma ou duas tiradas sacanas vencem qualquer atributo divino impregnado no DNA da tal amiga. No final das contas, entendemos que elas eram bem das chatinhas e eles, os garanhões, uns babacas de marca maior. Por isso, ou pela dialética do meu papo doce e pérfido, eu nunca estive sozinha.

Abusando da Martinidade (salve a Vila, salve ele, salve Martinho!), eu já tive homens de todas as cores, várias idades e muitos amores. E feios (se vc foi meu amor, entrou no blog e ficou ofendido, desculpe. Provavelmente não estou falando de vc). Os bonitos - e houve alguns lindos - não conseguiram me matar de paixão. Pelos perfeitos, de testa retinha, boca desenhada e corpos com divisões claras entre os músculos, não chorei uma semana. Pelos que não se enquadravam, os vesgos, caolhos, de andar cambaleante, óculos grossos e algum desaviso, eu quis morrer, cortar os pulsos.

Pode ser coincidência, claro que pode, mas acho mesmo que é uma opção do olhar. Meu desejo vem no frêmito da imperfeição. E só Deus (e os meus suores) sabem da malemolência das paixões de rodapé. O cantinho mais escuro - e onírico - do desajuste me interessa mais do que a mesa bem posta e a luz direta. A via de contramão é sempre (um) melhor caminho. E os homens que não sorriem com dentes perfeitos, aiai, mordem como ninguém.


* moço do meus encantos: vc é o único que conjuga a perfeição de um deus com a virulência do meu espanto em carne, osso e líquidos, viu? :-)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

“Impressoes do tempo que muda em segundos”

Resposta `a viagem insolita de Ivan

Em certo momento, encontrei-me adulta numa vida solitaria, vontades pareciam dificuldades para serem minha luta, sem interesse alheio. Pensei estar sozinha, mesmo entre amigos, no trabalho de realizar. As situacoes duras e frias me mostravam apenas uma escuridao para encontrar meu caminho.... pensei que os trabalhos em equipe fossem apenas brincadeiras de crianca de um passado ilusorio. Foi enquanto eu comecava uma jornada cega. Mesmo assim, continuei ate o fim ja sabendo que o prazer viria no primeiro sinal de vitoria...

A vitoria foi encontrar pessoas dispostas a estarem juntas, nao apenas para a realizacao de sonhos, mas para uma vida em conjunto, para dividir os ingredientes, o momento de cozinhar e o sabor da comida. Saudei quando descobri que o problema anterior era meu relogio interno que estava des-regulado numa cidade que nao via o tempo passar, e que eu havia me deixado levar pela ilusao da sensacao do tempo.

Aproveitando melhor a vida onde dizem que nao se leva nada embora, sobra tempo para viver pequenas companhias, como a cor do reflexo da rua, o som da agua do quintal, o canto de raros passarinhos ou o sabor delicioso daquilo que nao se gosta na hora da fome. Se parar o tempo, tudo parece melhor para saborear. Aqui morre um ponto de vista para dar lugar `a mais uma experiencia de vida.

Blog-se

Nao sei bem se ‘e efeito das cidades ou do tempo, mas alguns buscam a perfeicao do outro. Alguns acreditam que ‘e preciso criticar e falar sobre o que acontece no mundo (inclusive essa ‘e a minha profissao: o jornalismo). Comentar a transicao talvez seja a necessidade de documentar a evolucao e no futuro dizer que assim fomos n’os. Blogs estao ai para serem testados da melhor ou pior maneira e com certeza ‘e uma boa quando se encontra algo de qualidade, “ja valeu a pena passar por tantos ruins”. ‘E como acontece tambem com as situacoes da vida!

Acredito que fazer arte pacifica o homem, logo, imagino que o poder desabafar deixa o mundo mais informado e tambem mais tranquilo. A informacao dos blogs chegara ao cansaco.... como o dia do juizo final, os blogs ganharao uma definicao, um resultado e finalmente o porque de ser.

domingo, 10 de outubro de 2010

Livros, se lê-los por que não tê-los?

Talvez o leitor esteja cansado de me ouvir falar de livros. Mas peço a sua paciência. Este escritor está cansado de falar do Lula. E os livros têm sido (e são) uma de suas boas companhias.
Diferentemente de outras pessoas, não sou chegado a baladas, danceterias, bares noturnos que tocam pagode e coisas afins. Sou pacato, caseiro. Gosto de passar um fim-de-semana junto à família e aos amigos. Gosto da reunião.
Entretanto, há “baladas” que gosto, como por exemplo ir a uma livraria, mesmo que não vá comprar nada. Gosto de ver os livros, conhecer as novidades, as edições de obras antigas. Uma mais bela do que a outra. Como por exemplo a edição da Dom Quixote do famoso livro de Cervantes ilustrado pelo Dalí. Uma beleza!
Gosto de lê-los, se possível. Não os leio por inteiro, como se pode fazer nalgumas livrarias. Sentar-se numa poltrona e ler durante horas a fio. Beber café, comer pão-de-queijo... Dá uma sensação de liberdade, de que o mundo é um lugar tranquilo e gostoso de se viver. Mas os leio, os degusto como posso e como quero.
Em São Paulo há algumas livrarias que permitem leitura sem compra, por assim dizer. Conheço a Livraria Cultura e a Fnac, que possuem um acervo excelente além de tudo.
Porém, não entendo por que algumas livrarias não aceitam que seus clientes tomem dos livros e os leiam em seu interior. Acredito que seja por que dessa forma os clientes lerão o que desejarem sem precisar desembolsar um centavo e, assim, a lógica capitalista não se fará. É o mais óbvio e talvez único motivo.
Mas acho que elas se equivocam. Pois, para quem gosta de ler, possuir o livro é mais do que uma vontade: é uma necessidade, quase um vício, uma certeza de que o conhecimento e assim momentos de prazer e paz estarão sempre ao seu alcance.
Outro prazer que tenho, e acredito que qualquer fã de livros também o tenha, é folheá-los, senti-los em minha mão. Mas não sou tarado, fique tranquilo. E isso não só com as edições luxuosas, alvos da cobiça, mas, e principalmente, eu diria, com as edições velhas, antigas, desgastadas, carcomidas, até, pelo tempo. Gosto especialmente dessas, que só encontramos em sebos, claro.
Tenho um prazer imenso em folhear um livro antigo, de páginas de cortes irregulares, amareladas pelo pai de Zeus, cheirando a sarrafo, com ácaros e tudo. O problema é a minha rinite. Mas.
Aqui em casa tenho alguns exemplares assim.
Por exemplo, a primeira edição das “Obras completas” de Camões com prefácio e notas de Hernâni Cidade divididas em cinco volumes, editadas pela Livraria Sá da Costa Editora. No primeiro, encontram-se as redondilhas e os sonetos do poeta; no segundo, as odes, as elegias e outros gêneros líricos considerados maiores; no terceiro, os autos e as cartas; no quarto e no quinto, Os Lusíadas. Uma edição ótima, pois além de ser antiga (fico devendo a data da publicação, por não tê-la encontrado) mantém ainda, mesmo que parcamente, a grafia da época.
Outro exemplar antigo, amarelecido, consumido pelo tempo, é a quinta edição de “Rubáiyát”, de Omar Kháyyám, poeta, matemático e astrônomo persa, editada pela Livraria José Olympio Editora, datada de 1944. Além dessa, possuo a primeira edição do “Teatro de Gil Vicente”, uma antologia da Portugália Editora, datada de 1959 e apresentada por António José Saraiva. Nesta a grafia da época é ainda mais abundante. Para mim, um mar onde posso mergulhar de cabeça.
Tenho também a segunda edição de “Aparição”, de Vergílio Ferreira, também pela Portugália, datada de 1960. E de 1951, a primeira edição do Clube do Livro da “Vênus de Bronze” do Merimée. Ambas atacam minha rinite. Fazer o quê. E uma não tão acabada assim, apesar de ser a mais antiga, data de 1941, é a terceira edição de “Amadis de Gaula”, traduzida por Rodrigues Lapa e editada pela Lisboa.
Gosto dessas edições, muito embora nem sempre aprecie o conteúdo delas, que é o caso aqui do poeta persa.
Mas não importa, tenho um enorme prazer em folhear um livro antigo, senti-lo em minhas mãos (repito: não sou tarado) e lê-lo com o maior prazer do mundo.

sábado, 9 de outubro de 2010

Oi, pessoal. Voltei. Com a barriga cortada por uma cirurgia de emergência, mas ainda assim inteira. Bom, quase inteira, que 100% nunca fui. Já nasci trincada...*risos*. Agora, ao texto! Beijos e boa semana.

Declarações


É uma segunda-feira de um sol indecente. O Rio de Janeiro continua vasto demais, cheio de esquinas e subterfúgios. Ainda vou odiar essa cidade, escreva aí no teu diário das minhas invenções, escreva, anote.

Meu corpo silva a tua falta. A lâmina da saudade corta nacos da minha carne: minha boca, meu dorso, meus pés, meus seios. Meus eixos. O apartamento vazio faz brotar um dragão vermelho e cheiros de urros e labaredas que vão tomando conta do meu desespero e que se controla com doses vulgares do que fomos, do que estamos, do que não fazemos a menor idéia (e nunca sei se essa é a melhor parte ou se é o que me deságua). Ele me co-habita, o dragão, e assiste comigo os filmes que não vimos juntos e os livros que não compartilhamos. E se ajeita no sofá, me morde as têmporas e queima meu tempo. É um bom dragão e adormece enquanto eu conto a nossa história cristalina, límpida e de final infeliz. Mas ele não chora porque diz que as lágrimas secariam como cera e formariam um dossel encantado, e nenhum encantamento merece a aflição dos meus dias sem você.

Sou sempre viúva, visto negro. Mas não tenho medo algum da solidão, veja você que avanço. Converso com cada um dos homens que tive, com cada um dos que terei, e lamento com eles que teu nome esteja tatuado em mim de maneira tão devassa, impudica. Todo rastro é lastro quando teu nome é o meio e nenhuma dor jamais será tão digna dessa cor vermelha, vermelha escaldante. "Minhas páginas estão marcadas, dear, se você quiser será assim", eu direi, e um ou outro tresloucado vai aceitar essa troca pouco justa e vai ter meus afetos com uma profundidade que não. E ele vai acreditar, e vai se entregar, e vai assentir, e vai renegar, e vai retrair, vai se machucar, e vai indagar. E vai me odiar. E eu vou te amar ainda mais em cada possibilidade com outro som, outro gemido, outro toque, outro corpo. Você é eterno e eu que defino o tamanho da minha vastidão. Eu. Mais ninguém. E nisso, cherry, nem você apita.

Não, não, eu não serei uma daquelas pessoas que tomam café com creme sozinhas no cinema enquanto esperam a sessão. Tampouco serei uma moça de cabelos molhados que mais olha para o chão do que para os outros entre estantes de uma livraria. Também não vou ter ares de pequena loucura, olhos fundos deitados sobre um livro, uma folha branca sendo preenchida enquanto um copo é esvaziado em algum restaurante quase chique da zona sul (tão digno de mim que indigna de tudo!). E nem me imagine como uma distinta senhora de cabelos brancos e óculos de aros vermelhos a dourar a pílula da vida alheia - sublimando os desejos que nascerão entre as minhas vírgulas - quando chegar a tarde dos meus anos todos. Não tenho fôlego para viver assim, aos poucos, pela tangente, você sabe. Vou seguir o roteiro que eu tão bem tracei, vou vestir a personagem e seguir bailando: mãos na cintura, olhares lascivos, risadas largas e tiradas de humor dúbio. Eu, elas e eles, todos. Porque eu sou mesmo muito boa em fazer amor, amigos e macarrão instantâneos.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Viagem insólita

Quarta feira. Minha vez de saraucultiar. Então vamos lá! Andei lendo aqui os textos e visitando blogs que enriquecem e fazem valer a pena o tempo e a navegação. Navegar é preciso, viver não é preciso, como já nos disse o poeta. E na imprecisão do viver, vejo alguns blogs e artigos e livros que, como já disse na minha primeira postagem, me fazem pensar em almas cheias de lacunas (todas as têm, claro), mas das enormes, vazios que mostram, às vezes, a "simples", que é na verdade complexa, necessidade humana de falar. Vejo letrados atirando pedras nestes blogs de gostos discutíveis onde só há desabafo e nenhuma tentativa de ir além do umbigo. Será que eu saí do meu? E é profundo! A necessidade humana de ser reconhecido, ouvido, aceito, compreendido tem feito dos blogs um meio de desabafo. Há quem o faça buscando um meio artístico, mas há quem o faça com os recursos que tem, sem a arte, apenas pintando o sete, o oito, o nove.

Blogs são divãs (o meu é d'Ivan, ok?) onde o analista não é um só, são muitos, alguns conhecidos, outros desconhecidos, alguns preparados para lidar com o exposto, outros não. É uma exposição buscada, sem dúvida, mas é preciso preparo para quem escreve e para quem lê. Não é tudo que nos agrada, mas também não é tudo o que escrevemos que agrada aos demais. Penso bastante nisto! De certa forma dou continuidade ao tema da minha outra postagem, onde falei da ida à livraria. Toda arte é via de mão dupla. Se não for, não é útil. E nem sempre é, ou nem sempre pra todo mundo. O que é bom ou ruim? Tenho meus conceitos e convicções e os sigo metodicamente, mas sem menosprezar (ou sem tentar menosprezar) os gostos duvidosos (às vezes muitíssimos duvidosos) dos "artistas"... Permitam-me as aspas, não consigo fugir da acidez da ironia.

Meio de semana, três canecas de chope alemão depois, algumas salsichas de vitela com ervas, coisa deliciosa. Arte da culinária, arte da degustação. Mas e pra quem não come carne ou não toma cerveja, haverá alguma "arte" nisto? Haverá algum prazer?

Prazeres ou a ausência deles são de foro íntimo. A busca por ele é constante e frenética. Porque um suposto deus nos teria criado com desejos se tivéssemos que refreá-los? Há uma grande contradição entre os pregadores religiosos (hipócritas?) e a real natureza humana. O prazer e o pecado são invenção de controle, úteis às igrejas, aos meios de comunicação e à conciliação de ambos. Pecado! O que seria isto? O peso de consciência de cada um tem sua medida. Livros sagrados, padres, pastores, rabinos, gurus tentam definir o que é certo e errado. Só consigo enxergar uma coisa plausível: onde termina meu limite e onde começa o do vizinho e o quanto posso ou não fazer uma intersecção com este limite. Há de haver concessão. Daí bom e ruim, bem e mal, virtude e pecado caem todos, conceitos fracos que são, pelo solo argiloso e ardiloso da teoria da relatividade.

E = m . c²

Sim, estou divagando e deixando fluir a livre associação tão cultuada na psicanálise. Nossa mente não nos leva de um lugar a outro por mero acaso. O acaso existe onde achamos haver destino e o destino inexiste (e é puro acaso) onde achamos haver determinismo. Este mundo é mesmo contraditório. Talvez esteja aí um pouco do seu tempero. Que seria de deus sem o demônio? De que nos teria que salvar? Não precisaríamos de um deus. A luz não faz sentido sem as trevas. O que haveria de a luz iluminar se não houvesse trevas? Maniqueísmos que predominam no inconsciente individual e/ou coletivo.

E meu blog, é bom ou ruim? Há todo um degradê. A questão, penso, pelo menos é o que penso neste momento... A questão está em saber em que região deste degradê, em que ponto entre os extremos maniqueístas está a fórmula mais adequada a cada tempo. O que foi bom antes pode já não ser mais. O que foi ruim antes agora pode ser "Cult". Mentes complicadas que mentem até para nós mesmos.

Esta postagem é apenas uma viagem, pegando carona na viagem postada pela Vanessa, sobre o que nos faz viajar e o que nos faz ver qualidades ou defeitos para nos fazer viajar, flutuar, criar, viver, ousar. Lanço interrogações e nem quero ousar respondê-las... Ficam aí a flutuar. É bom que venham respostas, tentativas de respostas, concordantes ou discordantes, e mais interrogações, até, pois é o que nos faz pensar, avançar, ser, viver até morrer. Morrer? Que é morrer? Fica para uma nova viagem em uma outra quarta feira. Enquanto isto, na medida do que der, vou lendo, vou escrevendo, vou ouvindo novas e velhas músicas, vou amando e odiando, vou tentando ser mais, ainda que às vezes sinta ser menos. Vou me permitindo ser coerência e contradição e tudo o que houver entre isto. Até outra quarta.

Pintura:
Jangada de Mèduse - Théodore Géricault

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O que te faz viajar?

Ao ver um filme, `as vezes, comeco a pensar que estranho 'e o efeito que ele realiza, de me fazer criar. O pensamento se liberta para um espaco novo, mistura-se, meu roteiro toma o lugar do autor. Comeco a mudar em velocidade e possibilidades a minha vida por alguns instantes.

Um dia, na plat'eia de um bal'e, a orquestra toca ao vivo. Nao 'e apenas a emocao, de arrepiar. 'E o prazer do pensamento que acorda como um formigueiro na mente, tendo visoes e querendo ser a arte no dia a dia. Dou conta da loucura que 'e a vida e das delicias que nos fazem represent'a-la, recri'a-la ou provoc'a-la. J'a passa do tempo de acordar e, caneta e papel sao os elos para inspiracoes. 'E como estar adormecido e acordar cedo, perceber que 'e possivel viver diferente. 'E pensar que aquela ideia 'e obvia e querer fazer parte daquela hist'oria. Ou ainda querer interagir com novas e proprias versoes.

Ao experimentar a arte, essa sensacao 'e extasiante, e eu jamais soube se este 'e o motivo de as pessoas estarem na sala do cinema ou do bal'e etc. Acredito que sim, pois 'e o motivo de eu voltar. Mas quando sou surpreendida e me pego viajando com algum artista, sinto a vida l'udica ao consumir boas producoes de livros, filmes, dancas e cancoes.

Deixo aqui a questao sobre o que te faz viajar!?

domingo, 3 de outubro de 2010

ATENÇÃO: Ler é prejudicial à saúde!

Pesquisas comprovam que o indivíduo que lê, aprecia a boa arte, tem a mente ativa, geralmente morre mais cedo do que a média, é mais estressado que a maioria da gente e, consequentemente, mais infeliz.
Eu sou um cara extremamente preocupado com minha saúde; e não desejo ir pro inferno bater um papo com Dante assim tão cedo, apesar de a idéia de voar às costas de Gérion não seja lá algo tão desinteressante... Imaginem: ser carregado por Efialtes!...
De qualquer forma, essas pesquisas me preocuparam, pois, como todos sabem, gosto de dar uma folheadinha nas páginas de um livro qualquer, mas que me interesse, e ver obras de umas mulheres, nuas ou quase, e às vezes até sem olhos, de vez em quando. Agora, depois que soube dessas pesquisas, meu coração acelerou mais do que o normal. Fui ao médico, e ele me disse: "Respire... Diga trinta e três... É, não tem jeito: a única coisa a fazer é dançar um tango argentino...". Nesse momento, pude mesmo ouvir uma voz (como aquela de Zeus gritando "Evoé!") em minha cabeça, que me disse: "Vai, Rodrigo, quem mandou ser gauche na vida".
Eu não mandei, tenho certeza. Mas se souber quem mandou...
Não que eu vá esmurrá-lo ou coisa parecida; mas o porei, lá no inferno, na vala do Lula e do Paulo Coelho. Isto é, se o Belzebu deixar, claro.
Estou num mato sem cachorro, meus amigos. Vejo-me condenado ao estresse, à infelicidade. Pensei em deixar a pena de lado e me dedicar a qualquer outra coisa; vender meus livros do Machado e comprar uns outros de auto-ajuda (agora entendo porque muitos dizem que os psicólogos são matéria morta...); deixar de ir ao MASP, à Pinacoteca, e ir mais à palestras sobre saúde mental.
Mas é difícil, pois quando não é a minha Musa, que me vem toda sensual, ui!, chamando-me pelo diminutivo, é o Van Gogh que me vem mostrar o quarto dele.
É... acho que só me resta mesmo dançar um tango argentino.
Que assim seja, então.
Evoé!

sábado, 18 de setembro de 2010

Primeiro, era a falta.

Amanhecia e era denso. No céu, apesar da fuligem da madrugada, os primeiros raios surgiam a fórceps pela largura das nuvens. A previsão não era de um dia bonito, nem de um dia feio. Mais um dia e só, como havia sido ontem e provavelmente depois e depois de amanhã. O importante era o minuto, ela sabia. Primeiro, o instante de constatar que o relógio tocava e ela ainda não tinha morrido, o que era um fardo cotidiano. Depois, vencer a água apitando no fogo, o café e o pão com manteiga, o ferro deixando vinco na roupa de trabalho, o pulso buscando a bolsa deixada no banco da cozinha. Então, os passos em direção ao ponto de ônibus, o bom-dia para o motorista, o barulho da catraca girando, a pressão do sangue sobre as pernas no trajeto, uma hora em pé, a comida do almoço, o trabalho na mesa, e assim, tic e tac, sucessivamente, até a redentora hora de dormir para quem sabe nunca mais.

Ela nem imaginava de onde vinha aquela ausência, uma lacuna que se abriu dentro do rasgo do peito quando era menina e nunca mais fechou, nem com as lágrimas de anos, nem com o avançar do tempo na maturidade. A dor resolveu viver ali, dormir ajeitada nos cachos do cabelo que lhe alcançavam as costas, bonita que era em seus trinta e poucos. Não se lembrava de ter sonhos e nem pesadelos, nunca tinha febre e nem saúde de ferro, não gostava de batom vermelho nem cor-de-rosa, não preferia a chuva ao sol (nem vice-e-versa). Viver era seguir em frente e repousar a respiração concentradamente no colo para, quem sabe assim, evitar que as bordas do buraco se expandissem para um não-ser maior.

Mas aquela manhã agitava-se diferente. Nada declarado pelo mundo em altos brados, mas a impressão que se insinua no modo como o vento toca o rosto na hora de abrir a porta da frente. Foi assim, quase com carinho, que a rajada da manhã interceptou o último bocejo quando ela destacava o pé para fora. Sem notar qualquer poesia, seguiu em frente. Na esquina, antes que pudesse adivinhar com qualquer dos cinco (sete, vinte) sentidos, uma figura destacou-se na rua. Era homem e usava chapéu, apesar da incongruência com os dias atuais. Olhos de castanho claro, duas avelãs, e boca vermelho-maçã. O rosto, marcado talvez pela varíola, tinha a aspereza da casca da goiaba e o cabelo, que escapava aqui e acolá na ladeira da cabeça, era mais amarelo do que um pedaço de pêssego tenro. O homem era todo feito de fruta.

O instante virou ventania, assoprou um turbilhão de reviravolta. A saia rodopiou num xote sobre a cintura, os pés bailaram como se fosse palco e um cheiro de jasmim atrevido empertigou-se nas narinas. Tudo pululava, tudo era pandemia. Ela não sabia se era o coração que retumbava no peito ou uma aurora bêbada que rachava a madrugada sonolenta sobre as pálpebras. Em solavancos, a alma aquecia e exigia, com esforço, cada teia da vida. Quando mais o homem se aproximava, já assim, poucos centímetros adiante, mais o ar faltava aos pulmões, mais os lábios separavam-se para dar espaço ao rugido mudo. Até o momento em que se cruzaram. Ela, tonteada pelo que não se explica, parou a meio palmo. Ele, um pouco a frente, virou-se e com um gesto gentil (tão gentil que quase obsceno), e lhe deu um...

- como vai?

Naquele instante, sem maiores explicações, o buraco fechou como se tivesse zíper. Ela lembrou do sonho da noite, algo com castelos. Sentiu a febre arder nas têmporas. Cismou que gostava da chuva. Quis um batom bem vermelho. Amou o dia. Já não importavam as sequências, os minutos. Mas quando deu por si, nada do homem, nada de cheiro, nada de sombra, nada de fruta. Desesperada, colou cambaleante ladeira abaixo. Onde estava? Quem era e por que era? Nada.

Ainda perguntou pela vizinhança, por acaso o pessoal da padaria tinha visto um homem alto e magro com chapéu? Não. No ponto de ônibus? Não. Aquela senhora na janela, teria visto? Não. O casal de enamorados na esquina? Não. A mãe que levava o rebento ao colégio? Também não. Ele foi. Ou não foi pra nunca mais.

E desde então foi a procura.

Sem buraco, só a dor.

Agora, a busca.


* Imagem: Madonna, de Eduard Munch

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Mais que Mil Palavras...

As palavras não descrevem os sonhos e mesmo que o fizessem, jamais poderiam expressar aquilo que uma imagem evoca a cada um. Que partes são tocadas, que sentimentos são despertados, que vontades emergem. Molhar o pé descalço nas águas frias? Pisar a terra forrada de folhas? Sentir o aroma de uma torta de maçãs assando? O calor da lareira, o perfume da terra?
Só a alma sabe, só ela sente. Passeiem na imagem, viajem, sonhem e deixem a alma trazer o melhor de vocês à consciência.
Todos precisamos de poesia, e a Natureza sabe tão bem disso!

Grande beijo a todos.

sábado, 11 de setembro de 2010

Quem me ensinou a voar...

Eu não era uma menina de muitas palavras, mas brigava feito o demônio. Ele não era um menino de muitas ações, mas imaginava que era o diabo. Vivíamos na distância que impõe a pré-puberdade, a atração irrestrita do outro e a repulsa em acreditar na maturidade repentina do corpo (que vai tomando formas onde nem se imagina).  
Tom (um nome pequeno e melancólico) era novo na vizinhança. Disso eu sabia e era só. A primeira vez que nos encontramos (numa tarde de sol teimoso, que nunca ia embora), ele me pediu para guardar um segredo. Baixou o corpo até o meu ouvido (eu nasci desprovida de altura, ele era imenso feito uma montanha, armadilhas da genética) e disse baixinho:
“eu sei voar”. 
E eu ri, ri como se fosse inevitável desconfiar. Ri uma gargalhada tão alta que ele corou no meio da praça e, indignado, rodou sobre os pés e foi embora. Fiquei quinze dias sem pousar os olhos nele, mas esperei com pressa. 
Depois, numa manhã um pouco azul, um pouco amarela, ele surgiu na ponta da rua. Andava tão desengonçado que parecia tropeçar no ar. Meu coração pulou. Ele foi chegando no meio da garotada, olhando em semi-círculos de timidez, e me chamou de lado.  
“Acredita hoje?”, me perguntou.  
“Só se você mostrar”, respondi, com medo de fazê-lo desaparecer mais uma vez.  
“Então vem comigo”.  
E eu fui. 
Atrás da igreja da cidade, protegidos pela sombra de uma jabuticabeira, ele pegou na minha mão.  
“Quer ver como se voa?”.  
“Quero, mas duvido”.  
“Fecha os olhos”.  
“Se você me zoar eu te bato” (eu era mesmo danada de brava). 
“Fecha os olhos”.  
Eu obedeci e ganhei o meu primeiro beijo na boca. A impressão que eu tinha, naquele instante daquele dia longínquo naquele pequeno território da minha infância, é de que o mundo acabaria na nuvem que se formava sob meus pés. Tom sabia voar, e me ensinou. 
Nunca mais nos beijamos, não assim, nem quando eu aprendi que meu ventre queimava, nem quando parti da cidade em busca do meu porto no Rio de Janeiro, nem nos meus fortuitos retornos à terra natal, mas trocamos segredos a vida inteira, as sensações, os espaços, os desavisos dos dias. Ele cresceu bonito, foi ganhar São Paulo, virou poeta. Hoje, casado e pai de uma garotinha ruiva, me liga toda semana para contar suas novas invenções. É meu melhor amigo, foi meu primeiro amor.  
Depois de tantos homens, tantas histórias, tantos enredos, ainda acho que ninguém me contou tão bem uma façanha. E eu nunca mais voei tão bonito.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

TCHAU, TATÁ!

Esta semana nos despedimos de uma companheira querida que por 14 anos dividiu conosco alegrias, sonhos, tristezas, frustrações, mudanças e tudo mais que compôs nosso dia-a-dia. Alguns momentos magníficos e outros péssimos foram relatados a ela, que sempre nos ouvia com carinho, paciência e solidariedade, demonstrando seu apoio com lambidas carinhosas ou uma patinha sobre nossas mãos. Pois é, a Tatá era nossa colega canina que, patriota, decidiu mudar para o outro lado em pleno sete de setembro, nos deixando com uma tristeza branda na alma. Até nesse momento ela foi como sempre era: discreta e tranqüila, nos poupando de vê-la agonizar e sofrer. Conforme escrevo este texto penso no quanto esta criaturinha que falava conosco através do olhar contribuiu para nossa felicidade.

Ela chegou com pouco mais de dois meses, irressitível em seu casaco de manchas brancas e pretas, olhinhos castanhos, jeito sapeca e simplesmente, ficou. Não sei quem a deixou em nosso portão, mas sou muito agradecida a este desconhecido pelo presente que nos deu. Seu nome veio do desenho da Cinderela, pois assim como o ratinho Tatá, era gordinha, comilona e cheia de graça. Simpática, brincava com todo mundo e tinha um fraco pelo jardim, que até pouco antes de adoecer, cavava com vigor, até ficar com metade do corpo enfiado na terra escura. Avessa a banhos, fazia corpo duro cada vez que via sua colega entrar em um, sabendo que seria a próxima da fila.
Este anjo canino cresceu com meus filhos e ouviu deles segredos da infância e da adolescência, conheceu amigos, namorados, paqueras e ajudou a colar corações quebrados e desiludidos, sempre com carinho e benevolência. Nunca nos negou conforto, carinho ou companhia, assim como nunca negou ao carteiro, ao guarda-noturno e ao lixeiro veementes latidos de protesto.
Era uma amiga e se foi. E amigos, quando se vão, deixam espaços vazios que jamais podem ser ocupados por outros amigos; eles têm lugar cativo, espaço reservado, poltrona numerada.
Fiquei vários minutos acenando para o carro que veio buscá-la, parada em frente ao portão no dia cinza e gelado, pensando que a tristeza é sempre de quem fica e torcendo, de todo o coração, para que exista mesmo um céu dos cachorros, porque se ele for real, Tatá já havia garantido, em vida, um lindo jardim para esburacar, muitos carteiros para emplicar e uma pilha de ossos para roer.

RIP Tatá, a gente ama você!

*Sei que fugi do assunto do blog e espero que me perdoem por isso, porém entendo que escrever é apenas uma representação gráfica do sentir e que sem ele de nada vale qualquer texto...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Na livraria...

Nada como, num dia qualquer e com tempo disponível, sair e ter o prazer de ir a uma livraria ou mesmo a um bom "sebo". Melhor ainda se a livraria em questão for do tipo que eu chamo de "multiuso", ou seja, aquelas em que encontramos não só livros, mas também CDs, DVDs, LPs (sim, eles voltaram!), um café aconchegante lá no canto, sofás, gente interessante e interessada em boas conversas. Para mim uma livraria "multiuso" sempre foi, sempre será, um "parque de diversões". É algo a se deliciar com calma, percorrer as estantes prediletas, olhar os lançamentos, novas publicações, novos e velhos autores, separar o joio do trigo. Sim, é preciso. Embora um espaço cultural, nem sempre o que encontramos nas prateleiras é exatamente algo que possa ser denominado cultura. Bem, mas hoje é minha primeira quarta feira, vou tentar deixar minha veia irônica um pouco de lado, ou ao menos tentar.

Cresci em um ambiente totalmente propício para gostar de leitura, de música, de conversa. Minha casa sempre teve inúmeros livros dos mais diversos estilos, que demonstravam a busca de meus pais pela cultura, mas também pela compreensão do incompreensível. E antes que me perguntem, não, nunca encontraram a resposta. Nem tampouco eu. Mas encontrei e continuo encontrando muito prazer na leitura diversificada. Os pontos de interrogação, que povoam a vida e a existência, penso, são a própria existência. Também havia na minha casa muitos LPs daqueles bolachões antigos, vinis pesados. Muita música clássica, MPB e jazz. Na medida em que fui crescendo e adolescendo fui não só descobrindo do que gostava mais, aprimorando o gosto, como também descobrindo coisas novas. O rock chegou na pré-adolescência, mas considero que de forma muito seletiva. Na antiga casa dos meus avós maternos e de duas tias, havia também a presença de um piano e um violão. Os ambientes ajudam a nos formar.

O paralelo que faço entre a descrição inicial da livraria, um ou vários passeios à livraria, e a minha casa da infância, bem como a casa dos meus avós paternos, é pela semelhança na disponibilidade de acesso à leitura, à musica, à boa conversa, ao café, às pessoas com conteúdo. Minha casa de hoje continua repleta de livros, CDs, LPs, DVDs e até algumas fitas cassete remanescentes. Aos poucos vou as convertendo para CDs. É puro prazer e não há necessidade que seja algo mais, mesmo me considerando um "eclético seletivo".

Tornei-me Engenheiro Civil, mas já dei bons esbarrões em outras áreas, tendo, por simples gosto, estudado idiomas e, por dois anos, Psicanálise. Meus primeiros escritos são antigos, mas não sei precisar com exatidão. Tenho certeza de que na adolescência eu já tentava fazer letras de músicas, já que tinha minha banda, já tocava bateria e arranhava um pouco de violão. Hoje em dia me considero baterista amador, e continuo arranhando violão. Já me aventurei pelo piano, mas o máximo que faço é tirar melodias básicas, especialmente com a mão direita e em dó maior, na maior parte das vezes, o que simplifica o fato de não ter que utilizar as "temidas" teclas pretas dos bemóis e sustenidos. Instrumentos também são diversão para mim, brinquedos de hoje em dia.

De volta à livraria, entro com olhar atento. Logo de cara me deparo com lançamentos e já me atiro às prateleiras com um olhar curioso e crítico, tentando entender o que fez cada livro e cada autor chegar ali, em lugar tão privilegiado. Competência, sem dúvida, mas há a competência da escrita e a competência do marketing. Ótimo quando ambas se encontram, mas em muitos casos só vejo a competência do marketing aliado ao oportunismo do poder de fisgar leitores em busca da leitura fácil e superficial, de livros onde está escrito o que o lado frágil e desamparado das pessoas busca. Autoajuda e afins, oportunistas surfistinhas, aquelas e aqueles que usam túmulos como degraus e tantas outras coisas que, de alguma forma, "contaminam" aquele ambiente que eu gostaria que não fosse assim. Mas acaba tendo um lado interessante esta observação. Vejo pessoas ávidas a folhear de forma inquieta, amedrontada e esperançosa as mais "novas" criações no mundo da autoajuda. Quando olho as pessoas que têm em mãos estas obras, vejo a busca humana pelo preenchimento do desamparo natural humano, em busca da "salvação fácil", de "fórmulas milagrosas" dos "segredos" contidos. Em contraponto faço a observação dos outros leitores, aqueles que empunham com naturalidade e serenidade livros da boa literatura, como um bom Saramago, Pessoa, Chico Buarque, Machado de Assis, Florbela Espanca, Garcia Marquez e tantos outros. Estas pessoas olham para estes livros, que virão a ler ou já leram, como quem olha pra dentro de si, como quem olha com profundidade tanto o mundo quanto os seres humanos. São pensantes, de uma inquietude mais serena. A turma lá da autoajuda busca nos livros exatamente o oposto, o que vem de fora e vem "de graça". Livros de autoajuda, costumo ironizar, e concordo comigo totalmente, realmente são de autoajuda: ajudam a seus autores. Há melhor definição, então. Sim, são autoajuda e levam fortuna a muitos oportunistas. Dificilmente um bom escritor, de literatura de verdade, alcança a fortuna fácil (suja?) dos livros de autoajuda. Não posso me esquecer, também, dos oportunismos da literatura superficial dos novos vampiros, dos mágicos adolescentes, mas aí o objetivo é outro: entreter de forma mais superficial. Embora não admire muito, deixo as pedras para os livros de autoajuda. Sim, eu atiro pedras.

A Vanessa, esta "fugitiva temporária" que vai para a Irlanda e que me seduziu me trazendo até aqui, propôs a criação de um espaço onde discutíssemos e refletíssemos estes aspectos editoriais, dos porquês de uma literatura dar certo ou não. Alguma coisa ela já citou no artigo dela onde ela relatou alguns pensamentos meus sobre as impressões leigas do que faz de um livro atraente. Falei da capa, da qualidade do papel, da diagramação, das fontes, da contracapa, das orelhas e, claro, nada disso teria serventia sem um bom autor. Este é um "adorno" importante, pois acaba complementando a arte da escrita com a arte editorial. Um livro pode ser bom e bonito, e acho isto ótimo. Mas dificilmente um livro bonito e vazio irá me atrair. O conteúdo vem em primeiro lugar, mas valorizo, sim, a forma em que este conteúdo é veiculado. É arte, também; faz parte, também. Confesso que os chamados "livros de bolso" sempre me atraíram pouco. Entre comprar um Evangelho Segundo Jesus Cristo, do Saramago, em uma bela e cuidadosa encadernação ou em uma edição de bolso, confesso que a forma me cativa. Compro a boa e bela encadernação. Gosto do livro de papel, gosto de admirá-lo. Além disso, adoro sublinhar, anotar, refletir por escrito, também. Se o livro é materialmente mais bonito, acho que fica mais bonito refletir. (rs...) São impressões minhas, subjetivas, mas eu noto, ao observar as pessoas nos meus passeios às livrarias, que isto conta, sim. Conta nos livros, nos CDs, nos DVDs, nos LPs etc. Aliar a qualidade literária à qualidade editorial (e aqui me refiro à beleza plástica), são atrativos que tem um valor considerável, sendo a base verdadeira o conteúdo. Não falo de luxo, mas de bom gosto.

Pego os livros que quero namorar, me sento, peço um café, pego também alguns CDs e outros itens. Namoro calmamente, leio as contracapas e orelhas, folheio, aprecio as capas, vejo a biografia do autor, quando disponível, admiro o todo, leio trechos, penso muito e daí acabo por separar os "eleitos" do dia. Passo no caixa, pago e saio. Levo as aquisições na mão, em uma sacola (e agora tenho aderido às sacolas de pano, que são ótimas!). Como num ritual antigo, chego em casa, pego um por um, dato e escrevo meu nome, como quem marca um gado, e começo a leitura, via de regra, à noite.

Onde entra o Ivan que escreve? Bem, para mim uma coisa sempre puxou a outra. Ler me inspira a escrever e por consequência escrever me faz buscar mais conhecimento em boas leituras. Sou um "saramagomaníaco", órfão recente, mas ainda há tanto pra se ler, dele e de tantos outros autores. Me perco na imensidão do que tenho vontade de ler, mas me perco como quem se perde em Veneza, num delicioso labirinto belo e cheio de riquezas que me fazem olhar, no fundo, para mim mesmo. Escrever, para mim, é catarse, é imersão. Leitura também é, e é busca, mas busca madura, e não busca fácil. O assunto é inesgotável. Volto numa próxima quarta enquanto vou também lendo e comentando. Até lá devo ter lido algo mais, visto algo mais, comentado algo mais, me tornado algo mais. Até lá a Vanessa já estará nos lendo lá da Irlanda.

PS:
Vanessa, não se esqueça de tomar algumas pint Guinness por mim, ok? Enjoy your time! Que este um ano seja muito bom pra você. E, mais uma vez, obrigado por ter me convidado para estar aqui, obrigado a você e a todos aqui. Have a nice trip.

sábado, 4 de setembro de 2010

Cá estou eu, mais uma vez atrasada.

Sábado, quase madrugada. Como a desculpa mais gostosa para a minha consciência culpada, vou me lembrar que é nela, alta noite, que moram os amantes. Façamo-nos, pois, destes. O blog, ah, o blog, a alcova! (Tô perdoada? *risos)

Pois bem. Hoje eu estava lendo uma matéria sobre os textos colaborativos que estão surgindo graças ao ciberespaço (Jornal O Globo, Caderno Prosa & Verso, dia 04 de setembro), e me deu um nó na garganta.

Olha, eu sou bem da moderninha. Juro. Apesar de estar, no momento, monogâmica, não acredito que seja receita de felicidade para ninguém. Creio piamente que somos bissexuais, todos nós (que Freud esteja conosco - ele está no meio de nós!). Símbolos sagrados, para mim, são puras expressões culturais (e, como tais, merecem todo o meu respeito, mas não a minha devoção). No meu mundo, sexo é uma coisa, amor é outra, diferente e quase inalcançável. Drogas? Livres, por favor: "faça o que tu queres há de ser toda lei". Liberdade só tem um limite: o direito do outro de também ser livre, em cada possibilidade que a vida deu pra ele. Mas com meu texto? Ah, não! No meu texto não, violão!

Produção de literatura é íntimo demais, não dá para dividir. Ok, ok, vc pode produzir junto - as trocas de correspondências, por exemplo - mas vamos chamar isso de outra coisa. Aquilo que meu inconsciente projeta, que minha cabeça simboliza, que minha língua traduz, que meus dedos escrevem...ah, mano, aquilo é meu, só meu, egoistamente meu. Meu, meu, meu. Não venham esses tais dizer agora que isso tudo vai virar uma grande suruba das letras! Nãnãninãnão. Isso aqui é uma casa de família, oras pois. Humf.

...

Meu Deus! Virei uma reacionária!

...

:-/

Beijos e até sábado. Vou cortar a estrada para rever os meus na minha Sampa querida.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Algumas Palavras sobre a Profissão...

Oi, pessoal!

Meu nome é Laura e eu sou a autora das quintas.
Por ser meu primeiro post, vou fazer uma apresentação curtinha para vocês conhecerem um pouco de mim: sou escritora, tenho 50 anos, 35 livros, 2 filhos, 2 gatos e duas cachorras vira-latas se recusam a concordar que já têm idade suficiente para parar de esburacar o jardim. Como a Dani, também "deseduquei" meus sobrinhos antes de ser mãe, e acabei usando um pouco desta experiência "deseducativa" para deseducar meus filhos..rs.
Moro em Santo André - SP há quase oito anos e antes disso morei em vários outros estados, mas Santo André foi uma opção de coração. Gosto demais daqui, gosto demais do bairro onde moro e da vida tranquila desta cidade.

Como não sabia direito sobre o que escrever, acabei escolhendo falar um pouco do que eu aprendi nestes anos de carreira. Sei que ninguém é modelo para ninguém, mas vale sempre repartir um pouco da experiência que acumulamos. Afinal, conhecimento que a gente não reparte é feito livro na estante: só serve para criar poeira e teia de aranhas.
Então, vamos lá.

Quando um amigo me pediu para bater um papo com a Vane sobre o mundo editorial, confesso que fiquei na dúvida sobre o que dizer. Por experiência própria, sei como um livro – principalmente o primeiro – é importante para o autor, quanto carinho e expectativa colocamos nele. A menos que a pessoa queira publicar pela vaidade de fazê-lo, um livro carrega muito de quem o escreveu, expressa partes de sua alma, de seus valores, de seu sentir. E como dizer a uma jovem poetisa, cujos olhos se enchem de estrelas ao fitar o mundo, que para concretizar seus sonhos, precisaria também concretizar seus passos?

Depois que respondi à Vanessa, fiquei com um peso no coração, imaginando que talvez tivesse sido concreta demais em minhas palavras, mas ela soube filtrar e entender o que eu quis lhe dizer. Foi desta conversa que nasceu o convite para um encontro e dele, a idéia deste blog.
Nestes anos na profissão de escritora aprendi muito sobre coisas que não estão escritas em lugar nenhum e ao contrário de um colega famoso, penso que algumas dicas são importantes para facilitar a caminhada.
E a primeira delas e a mais importante é: tire as estrelas dos olhos e coloque os pés no chão. Sonhe, mas não se iluda. Projete seu sucesso e seu crescimento, mas tenha em mente que não há saltos, há caminhos e que tudo é fruto de um trabalho bem feito, às vezes mais interno que externo. Errar faz parte do processo de acertar, então se algo não acontecer como você queria, aproveite a experiência e “toque em frente” como diz o pessoal.
Mais algumas coisas que vale a pena saber:

- Ninguém é um produto acabado e a escrita melhora com a prática, portanto escreva muito, leia muito, perceba muito.
- Ouça opiniões, mas coloque um filtro no ouvido para saber quando o que estão lhe dizendo é válido e merece atenção.
- Não veja seu livro como algo intocável, até porque ele não é. Editoras mexem nos textos, mudam títulos, mudam sequências. Faz parte do trabalho.
- Normalmente o escritor não tem visão comercial, não conhece dos truques editoriais e ignora processos de distribuição e venda de livros. Informe-se, isso é importante. Saiba como funciona o mercado editorial, leia sobre o assunto. Você nunca sabe quando, em uma entrevista, vão lhe perguntar sobre isso. E não é legal ficar com “cara de parede” diante do entrevistador..rs.
- Seu livro precisa vender e para vender tem que ter apelo. Para ter apelo, tem que haver publicidade e se você está começando, prepare-se para fazer isso você mesmo. Divulgue seu trabalho, bote “pilha” nas coisas! Não espere cair do céu, vá atrás. Utilize a internet para contatos, crie blogs, abra uma comunidade no orkut, coloque seu livro no Skoob, crie grupos, converse com as pessoas, crie parcerias, visite livrarias. Dedique-se de corpo e alma à sua profissão.
Lembre-se, estamos no Brasil, país cujo total da produção literária é menor que a produção literária de apenas UMA editora alemã. Para se firmar neste mercado, você tem que mostrar a que veio sem perder, obviamente, a naturalidade.
- Outra outra coisa fundamental, isso para quem tem livros em livrarias, é papear com os vendedores. No final das contas, são estas pessoas, mais do que quaisquer outras, que vendem seu livro. Fale com elas sempre que possível, explique sobre a história do livro, enfim, seja agradável e por favor, baixe a bola! Ninguém é obrigado a conhecer você ou a achá-lo um Einstein da literatura só porque publicou um livro! A maior queixa do pessoal das livrarias – de todas – é o ego dos escritores.
Não vou mentir e dizer que viver de literatura é “sopa” aqui no Brasil, mas é possível sim e depende muito do autor e do quanto ele está comprometido a pagar o preço desta viagem. E pagar o preço inclui ter que mexer no livro, entender que vai se tornar uma pessoa pública até certo ponto e que, portanto, precisa ter paciência e disponibilidade, ser simpático, atender aos leitores com carinho, não se deixar levar por elogios ou críticas, mas se manter fiel à inspiração.
E gente, o mais importante de tudo: vamos parar com essa coisa de que arte e dinheiro não combinam! No final do mês, todo mundo precisa pagar as contas, não é?
Concretude, lembram?
Beijos!

sábado, 28 de agosto de 2010

Olá.

Hoje é sábado, não é? Bem, vá lá, não é muito sábado, já que faltam dez para amanhã, domingo, e o ontem, sexta, já passou faz tempo. Provavelmente, estou atrasada na minha primeira publicação porque, segundo consta, são meus os dedos que vão sobrevoar este blog no melhor dia da semana, este que já acaba. Sábado, o tal. :-)

Para um primeiro post, como para um primeiro papo, minha apresentação: meu nome é Giovana Oliveira (de mãe) Santos (de pai) Manfredi (de ex-marido) e, por convenção internacional, apenas Giovana Manfredi que, sei lá, traz alguma coisa de italiana pura a esta filha de Santo André, porto sem mar que me viu desamarrar o navio aos 23 anos. Vim para o Rio de Janeiro, a terra que vive sob o Cristo de braços abertos, o país da Guanabara, quando me casei, dez anos atrás. O casamento com o Lúcio findou-se (bonito, um amor que viveu tudo o que deveria), mas o Rio continua aqui, pulsando no meu cotidiano.

Por efeito do acaso, do qual nunca sei se desconfio ou me devoto, fui trabalhar na televisão. Não, não sou uma atriz linda e de dentes perfeitos. Sou pesquisadora-aprendiz de roteirista. Trabalho principalmente com a Gloria Perez, o que me faz pular o coração de amor e a alma de contentamento. Não há mestre melhor, acredite.

Por (de)formação, jornalista, mas poucas vezes as redações viram as minhas sardas. Sou uma rapariga da literatura, tenho um caso com a palavra, sou amante de frases, que me serpenteiam e se enroscam nas minhas pernas sem pudor e, por vezes, eu acho que essa minha relação vulgar com o mundo simbólico do escrito é o que há de deus em mim. Minhas reportagens são, portanto, olhares cheios de vírgulas sobre os acentos agudos de alguém. Não sei nada de imparcialidade. Jornalismo literário é a minha praia. E agora estudo cinema na Escola Darcy Ribeiro. Uma delícia.

Sou tia de quatro rebentos lindos, Luisa, Júlia, Isabela e Enzo. Não apredi a vontade de parir, mas exerço a deseducação dos meus sobrinhos com afinco. Sou casada com o moço mais bonito da espécie, mais inteligente do planeta, mais companheiro da galáxia e, te juro, não entendo bem o que ele está fazendo comigo, como é que ele lida com essas mudanças de temperatura dentro de mim, ora glacial, ora vulcânica. Jefferson. O nome dele. Jefferson. Um pouco anjo, acho. Meu menino.

Bom, sou eu. Quer dizer, parte de mim. Espero falar de tudo um pouco aqui, numa misturada boa em gênero e tamanho: literatura, cinema, relações de cultura e afeto. E também de culinária (esta parte é mentira). Fale também, mano, que aí...aí dá certo.

Beijo e até sábado.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

SEGUIDORES: como ter um blog popular?



Começo o dia de hoje como se estivesse no escritório, moro no silêncio da casa de esquina onde os escapamentos dos carros batem no chão da curva, as pessoas passam como se não tivesse ninguém dentro de casa e contam em bom tom suas histórias, algumas brigam e outras cantam. Apesar do almoço estar me esperando para ser feito, eu ligo o computador e lembro que tenho dois blogs que dependem também de mim para ganhar destaque e leitores. Tem gente que tem blog ao mesmo tempo em que carrega a responsabilidade de empregos, mas a popularidade de sua arte na Internet não esquenta a cabeça com as obrigações habituais do mundo lá de fora; ela quer atenção especial!

Já tenho em mente há alguns dias o que quero postar neste espaço, tenho um relato que parece literatura da realidade e com certeza é informação que muita gente terá prazer em ler. Em uma de minhas conversas com o nosso colaborador Ivan Bueno, fui seduzida pelas palavras que motivaram o título de hoje. Se você estivesse dentro da casa de esquina, e se a casa fosse virtual, você escutaria ele e eu passando pela calçada e a conversa dele seria a seguinte:

“Comecei a postar meus escritos no blog há pouco mais de um ano, de forma totalmente descompromissada, sem divulgar nem nada. Um belo dia, ao conversar com uma amiga de adolescência, ela perguntou se poderia me mandar um texto para eu ler. Era um texto tão bom, mas ao mesmo tempo tão confessional que foi daí que surgiu minha coragem de me expor (afinal, quem escreve se expõe, sim!).

Falei para ela do meu blog, ela adorou e quis criar um. Nisso ela descobriu que outra amiga dela tinha acabado de criar um blog (ambas são professoras de literatura) e foram minhas primeiras seguidoras. No começo eram 3 seguidoras: estas duas e outra amiga. Depois foi aumentando aos pouquinhos, até que um site de Porto Alegre, que é de uma editora (Vidráguas), me descobriu e publicou um poema meu.

Há duas semanas recebi um convite pra ter um poema no próximo livro da dona do blog-editora e adorei a ideia. É um livro de poemas dela, que tem um estilo bem diferente do meu, e de convidados dela, dentre os convidados, eu e as minhas primeiras 3 seguidoras.

Hoje estou com 167 seguidores. Como cheguei a estes números? Não sei dizer, mas a Gê, minha amiga do início da história, diz que ‘quem escreve quer ser lido’ e descobri que é a mais pura verdade, como é verdade que quem toca quer ser ouvido, embora haja um grande prazer em tocar bateria sozinho, também. Na fotografia, idem, a gente quer mostrar. O artista, como diz o Jô (Soares), sem nenhum tom pejorativo, é um ‘exibicionista’. Nesta conotação com que ele fala, concordo. Queremos ser lidos, ouvidos, vistos. Se isto um dia virará negócio, não sei. Ficar importantes? (rs...) Quem sabe?”


Ivan e eu continuamos na calçada virtual até chegar à este blog SaraUCultiandO, depois de muito bate-papo. Meu escritório da internet, então, é como um trabalho prazeroso onde tenho uma imagem para cuidar:: participar de outros blogs, colaborar com comentários, ter contas nas redes sociais, responder e agradecer os resultados, ser solícito. É igual na vida, se estamos presentes na vida das pessoas, elas nunca faltam quando queremos companhia.


Ivan me ensinou também a lei da insistência. Ao mandar meu comentário pelo e-mail, ele me responde: “Volta lá no blog e posta este comentário lá, vai? Tenta, insiste, dá um tapa na CPU ou no notebook ou na tela ou em tudo, mas posta lá, vai? Promete, promete? Diz que sim, vai? (rs...) To aguardando e roendo as unhas enquanto espero. Pelamordedeusdocéu!”. Isso não é estratégia apenas, mas personalidade. Fica aqui a questão para discutirmos: quais seus recursos para conquistar seguidores? E se você é um seguidor, qual o tempo que reserva para ler seus blogs favoritos?